sábado, agosto 28, 2010

Correndo praí.


Você chorando. E eu aqui, querendo correr praí, que nem você corria pra mim quando eu era pequena e chorava com medo do escuro. Querendo arrancar essa dor do seu olhar e depositar em mim, afinal, por incrível que pareça, apesar de bem mais jovem, ando mais calejada que você, e eu não me importaria em ter que carregar mais uma dose só pra vê-la sorrir logo. Eu imagino a solidão que você sente, embora esteja praticamente o dia todo ladeada por tanta gente. Ninguém nunca vai substituir sua metade que se foi. Eu perdi meu vôzinho; você, seu companheiro de mais de meio século. Incomparável. Eu nunca imaginei minha vida sem os dois: a foto de vocês já desbotada no meu criado mudo gritava isso todo dia.Eu ainda não consigo visualizar você sem ele ao longo dos próximos dias, mas vou ter que arrumar um óculos, porque esses dias virão. Também não vou mandar você parar de chorar. A morte é uma sacanagem mesmo, e ponto. A dor ainda é aguda demais, e lateja sem dó. Talvez porque esteja tudo muito recente ainda. Talvez porque seja assim mesmo. Talvez passe logo. Talvez não. Mas, olha, vó, já terminei o post. Me espera; tô correndo praí.

quarta-feira, agosto 25, 2010

Saudade.

“Saudade é não saber. Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.” (Martha Medeiros)

Já declamei versos de saudade, já cantei suas nuances e julguei senti-la de forma constante em toda sua intensidade, até a morte me assaltar e me fazer descobrir que saudade mesmo é o vazio que grita quando a gente busca com os olhos em todos os cantos da casa aquela presença tão estimada, mas só encontra vestígios de alguém que passou por ali mas já se foi. Saudade é a falta do abraço frouxo, mas tão denso de amor, do beijo envergonhado e da benção silenciosa. Saudade é uma vontade forte de ver de novo, é a dor de não mais poder, é o medo da ausência perpétua. É a lágrima que rola de madrugada quando vem a certeza de que o sol vai chegar novamente, vai iluminar aquele canto, mas ninguém vai mais estar ali pra sentir seu calor. Como diz Fábio de Melo, a saudade é a forma que quem foi arranjou pra ficar. É a forma que quem ficou arrumou pra continuar.

domingo, agosto 22, 2010

A genética.

"A família é uma instituição divina - Jesus nasceu no seio de uma família, ainda que num estábulo e distante da própria casa - mas ali estava uma família, de humildade extrema, porém de grandeza absoluta. Assim foi que se formou nossa família, em verdade, humilde, mas cheia da graça divina transformada em fé e amor. Eu e Elza - a companheira querida - o embrião de uma família, um lar. Nós sempre fomos mãos seguras no arado, firmes no trabalho, na construção do patrimônio que, se não é grande, é o bastante para nós, e somos gratos a Deus por tê-lo. Em momentos diferentes de nossa vida, chegaram nossas filhas... Maria das Graças, Gal, e Maria de Fátima (Fada, e com mais ternura, Fadita). Era a felicidade completa, a razão de ser de nossa própria vida - motivo maior de nosso trabalho, alegria para viver; descrever o que está no coração é impossível através das palavras. Esse enlevo natural da família... batizados, 1ª comunhão, 15 anos, estudo, formaturas... até que um dia aconteceu o amor, e Gal foi com o cavalheiro dos seus sonhos, o ser amado. Guardamos na memória os lances mais belos do casamento. Noiva e bela, Juracy a recebeu para tê-a como esposa e companheira, a mãe da netinha que eu amo: Marianne. Fátima, filha batizada sob a invocação de Nossa Senhora de Fátima. Se nosso desejo fosse (e era) o seu casamento no altar de Santo Antônio, o destino nos colocou aos pés do santo de nossa escolha, com a presença da imagem de Nossa Senhora de Fátima, madrinha de nossa filha. Meu caro José Neto, estou vivendo o momento mais feliz de minha vida - trago minha filha para ser sua esposa com a benção do matrimônio, o presente maior na data do meu aniversário. Ame-a o quanto nós a amamos - e com o mesmo amor vamos amar você como um filho. Dou graças a Deus por esta hora, e pelo que estou vivendo. Minha filha, Deus a abençoe."

[Geraldo Teixeira - in memorian]


(Crônica escrita e lida em 07/05/1988, data de seu aniversário, na cerimônia de casamento da minha tia).
P.S. (Meu avô completou apenas o Ensino Fundamental II - até a 8ª série)

sexta-feira, agosto 20, 2010

Naquela mesa.

"Naquela mesa tá faltando ele e a saudade dele tá doendo em mim..."

(Sérgio Bittencourt)


Hoje minha avó retornou à casa de vocês. Foi duro, mas ela é forte - bem mais do que eu pensava. Abriu a bolsa com carinho, tirou a sua aliança e colocou no dedo dela. Chorou um pouco, lembrou do juramento que fez no altar e disse com a voz engasgada de saudade: "na alegria e na tristeza, na saúde e na doença". Chorou de novo e chamou a gente pra almoçar. A mesa já estava posta. Ela sentou-se e chorou, vô. Não tinha como não chorar. O lugar da mesa vazio. Parecia que você ia chegar a qualquer momento... mas você não chegou. Nem vai mais chegar. Sensação pior nessa vida não há. E o pior é que a lacuna não é só geográfica; ficou um buraco na alma de cada um lá de casa. As lembranças, de tão vivas, pululavam das nossas mentes, dos nossos corações e vertiam gotículas de lágrimas nos nossos rostos saudosos. Mas, a sacralidade da mesa permanece. Aquela mesmo, que você sempre prezou e nos ensinou. E seu prato também.

segunda-feira, agosto 16, 2010

Nunca mais.

O que dói é o nunca mais. Nunca mais ver você, nem seu sorriso puro e já cansado, nem seu jeito, que de tão simples era o mais lindo que havia... nunca mais ouvir sua voz grave e forte, nunca mais sorrirmos juntos na mesa com você chupando laranja e contando piadas depois de comer aquela farofa de feijão. Já dói. Entrar lá na casa. Seu lugar no sofá, na mesa... naquela vida que era tão nossa. O vazio, não se mede. A dor, não tem nome. Nunca mais. Você cochilando na hora da novela. Seus pijaminhas nem seus chinelinhos que minha vó escolhia com tanto bom gosto e amor. Você me chamando de "Ninha". Nem você me oferecendo coalhada de manhã cedo e eu dizendo: "eca, vô!". Dói demais a certeza de que os anos vão passar, e meus filhos não terão o privilégio de olhar no seu olhar e admirá-lo tanto quanto eu pude. Dói ficar órfã de avô. E nunca mais poder te dizer que eu te amo seguido de seu "obrigado" desconcertado e de seu sorriso desconcertante. Dói tanto vô! É espada que transpassa a alma. Você levou um pedaço de mim, mas deixou tanto ensinamento de como ser humana, de como ser melhor, que eu tô começando a acreditar que esses vinte e oito anos que Deus me permitiu passar com você foi mais do que uma simples dádiva: foi carinho de Deus para mim. Obrigada pelos genes da música e da escrita, do gosto pela leitura e da inclinação para o bem; não tenho dúvida que vieram de você. Minha maior alegria e meu maior orgulho é o maior título que tenho, que você deixou pra mim, cravado na alma, nos cartórios e no sangue, e que nem a sua morte nem a minha poderão me arrancar: ser a NETA DE GERALDO TEIXEIRA. Eternamente, vô... eternamente.

sexta-feira, agosto 13, 2010

Quem?


"Minha lâmpada de cabeceira está estragada. Não sei o que é, não entendo dessas coisas. Ela acende e, sem a gente esperar, apaga. Depois acende de novo, para em seguida tornar a apagar. Me sinto igual a ela: também só acendo de vez em quando, sem ninguém esperar, sem motivo aparente. Para a lâmpada pode-se chamar um eletricista. Ele dará um jeito, mexerá nos fios e em breve ela voltará a ser normal, previsível. Mas e eu? Quem desvendará meu interior para consertar meus defeitos?"


[Caio Fernando Abreu]

quinta-feira, agosto 12, 2010

quarta-feira, agosto 11, 2010

Só desabafo.


♫"...quis ter os pés no chão
Tanto eu abri mão
Que hoje eu entendi
Sonho não se dá
É botão de flor
O sabor de fel
É de cortar..."♫


[Rodrigo Amarante]




Em outras palavras: cuidado com aquilo em que você se debruça a acreditar... Nem tudo vale o penar. Não renuncie suas convicções e muito menos sua essência a troco de promessas de vidro; não abra mão de você, dos seus desejos e perspectivas, da sua individualidade, da sua humanidade e do seu prazer, em troca de um par de asas que você nem sabe pra onde [exatamente] o levará. Acredite: o céu do outro, pode ser o inferno pra você.
P.S.(Não são conselhos; é só desabafo.)

segunda-feira, agosto 09, 2010

A-gosto.

"Para atravessar agosto é preciso antes de mais nada paciência e fé. Paciência para cruzar os dias sem se deixar esmagar por eles, mesmo que nada aconteça de mau; fé para estar seguro, o tempo todo, que chegará setembro - e também certa não-fé, para não ligar a mínima às negras lendas deste mês de cachorro louco."


Caio F.

sexta-feira, agosto 06, 2010

Foda-se.


Não sou intacta. Sou porosa. Você entra e me conquista; eu o agiganto e logo caço um laço e um lugarzinho para acomodá-lo dentro de mim. Se você entra e bagunça, vai se dimuindo a cada dia. Minúsculo, vai escorrendo pelo nó do laço; vai vazando pelos poros. Vai pra fora. E eu deixo, quando não ajudo, empurrando também. Sim, talvez eu ainda continue esperando coisas dos outros, como respeito e consideração, e ainda continue levantando a bandeira da política da segunda chance, mas da mesma forma que eu não aprendo nunca, tem gente que não aprende também, então a ordem interior agora é: fora! E não. Eu não estou sendo dura demais, nem intolerante demais, e se eu estiver sendo, foda-se. Apesar de tudo, eu ainda sou mais eu. Sempre.

terça-feira, agosto 03, 2010

Só você.

Você é realmente único, porque, se ficar parado na linha do trem sozinho, ninguém fica, imagina segurando a mão de alguém. Só você mesmo.

segunda-feira, agosto 02, 2010

Outra carta pra você.

Eu só queria te dizer que, independente do que aconteça, eu amo muito você. Eu sempre amei, e me perdoe por meus traumas que, por tantas vezes, ofuscaram o que eu sinto por você. Que quando a morte me chegar, vai doer muito mais nunca mais poder te ver, te tocar, sentir seu cheiro e seu gosto, te olhar dormir, brigar com você por causa das suas idiotices e ouvir sua gargalhada, do que me despedir da vida, em si. Que mesmo esmagada por dentro, eu ainda consigo amar você, e que vou amar até chegar ao céu ou ao lugar pra onde eu for... Que talvez eu ainda esteja prosseguindo pelo seu amor que, comparado ao meu, é elevado ao cubo, porque enquanto eu desisto de mim todos os dias, você nunca desiste... Que eu ando oca; mas a única coisa que perambula por aqui por dentro ainda é isso que sinto por você. Porque você faz das tripas um coração pra criar novas pontas de felicidade a cada dia, só pra tentar me arrancar o sorriso mais amarelo do mundo, que nem clareamento dental dá jeito. Porque minhas raras risadas se devem às suas palhaçadas e ao seu abraço que me envolve e me consola na hora em que eu vou dormir. Porque você existe, e ponto. Só por isso.