quarta-feira, março 31, 2010

Falta.

"Falta sempre alguma coisa... Falta uma fase da lua, uma estrela no céu, um beijo roubado. Sobram a falta de alma, o silêncio que dói e que machuca. Falta uma pessoa, uma voz, um som. Falta sempre alguma coisa que me complete, me mude, me faça acreditar. Algo que me faça querer acordar todas as manhãs. O que me falta é sobra... o que me sobra é falta.”


Vanessa Class

segunda-feira, março 29, 2010

Resolvi escrever.

Resolvi escrever porque creio que o que quer que eu fale, no tom que seja, não adianta mais. Ou melhor, nunca adiantou. Esse escudo que você traz em si é maior e mais forte do que minhas exímias e prolixas palavras, ainda que elas carreguem volume e dor. Resolvi escrever pra poder botar pra fora. Ando tão cheia de mim... tão cheia de você! Transbordante, eu diria. Afogando. E isso me dói tanto! Vou morrendo aos poucos sem que ninguém perceba. Quer dizer, já andam percebendo. Eu não caibo mais em mim. Preciso sair, mas não encontro forças. Você não me ajuda. Cerra os olhos e a boca diante de tudo. E eu, mino por dentro, mais ainda. Um dia vou começar a derreter por fora. Não consigo entender de onde vem tanta resignação. Mas, até certo ponto, isso também vale pra mim. Enfim. Também resolvi escrever pra pedir desculpas. Não porque eu ache que não conseguiria fazer isso verbalmente, mas sim porque estou mais do que certa de que você vai usar aquele protetor auricular laranja, e mesmo que algumas ondas sonoras escapem por algum insterstício do mesmo, você vai, mais uma vez, preferir fingir que não ouviu, ou que não entendeu, ou o que for melhor e mais cômodo pra você. Resolvi pedir desculpas porque, se antes eu achava que nutria uma eterna gratidão por você, hoje eu conclui que, mais do que isso, nutro um remorso sem tamanho. Por ter te permitido entrar na minha vida desarrumada, cheia de pormenores dolorosos. Por ter te moldado à minha maneira. Por ter te usado. Por ter confundido as coisas. Por, ter, de certa forma ruído sua vida. E, por tabela, a minha também. Por ter sido tão ingênua. Por não ter pensado no futuro. Por ter acreditado na eternidade, em Coelhinho da Páscoa e Papai Noel. Por ter te escolhido para expiar meu sofrimento. Por ter te obrigado a carregar responsabilidades que não te cabiam. Por ter te feito acreditar em mim. Por tudo isso, me perdoe; mas, eu também acreditava em mim.

domingo, março 28, 2010

Coisas assim.

E de pensar que a nossa verdade se perdeu por conta de um mito. Ou pela fusão de vários. Por um céu que só havia sobre sua cabeça. Por medos bobos. Falta de maturidade. Eu não sei. Só acho que não se abortam coisas assim.

terça-feira, março 23, 2010

Quase sempre.

Eu me lembro quase sempre. Basta a tarde cair, a noite chegar... uma música tocar... basta não ter no que pensar. Que eu lembro. Quase sempre. Quase nunca esqueço. E de lembrar, quase dói. E de doer, quase morro. E de morrer, ressuscito. Pra, quase sempre, lembrar de novo.

sábado, março 20, 2010

Máquina do tempo.

É a minha máquina do tempo.
A diferença é que não sou eu quem entro dentro dela;
é ela quem entra dentro de mim.

quinta-feira, março 18, 2010

Quando gira o mundo.

Dizem por aí que o mundo é grande. Mentira! Esse tal mundão é bem pequenininho. Será que um mundo tão grande levaria apenas vinte e quatro horas pra dar a volta em torno de si e uma eternidade pra girar em torno de nossa breve vida?

terça-feira, março 16, 2010

O biquíni.

É como se fosse um biquíni. Daqueles bem lindos, na última moda, que você daria tudo pra ter, inclusive o que não tem. Daqueles que quando colam no corpo parecem que foram feitos da nossa própria pele, que se encaixam direitinho em cada curva, o sonho de qualquer mulher [normal] desse mundo. Pois, bem. Você olha ele na vitrine. Todas as vezes que passa pela porta da loja não resiste em namorá-lo por tempo indeterminado. Até o dia em que resolve entrar e experimentá-lo. E pra total consumação da sua intuição, ele fica perfeito em você. Mas você, como sempre, num cúmulo profundo de indecisão, diz à vendedora que vai por aí e, "de repente" ou "quem sabe", "passa aqui na volta". Só que quando você volta, você não só não encontra mais o biquíni na vitrine, como o visualiza na perfeita sacolinha da boutique que flutua nos braços de outra cliente. Sim. Seu biquíni agora tem dona. Você dá meia volta, completamente arrasada, e com a certeza de que a partir de hoje, além de todas as outras frustrações da sua vida, você vai ter que se conformar com mais duas: com o fato de que aquele biquíni [lindo] vai viver colado nela; e o pior de todos: com o peso da verdade de uma frustração inútil: aquele biquíni, na verdade, nunca foi seu.

quinta-feira, março 11, 2010

A fuga.

Sim. Embora seu coração pulsasse a quantidade de vezes por minuto necessária para manter suas funções vitais, seus batimentos era inaudíveis. E só ela sabia disso. Ninguém havia encostado o ouvido em seu peito pra tentar senti-lo. Ninguém. Os poucos que haviam se debruçado sobre sua estória também haviam desistido dela. E ela estava a um passo de desistir de si. Depois de continuar vagando ao ermo, sem direção e com os ombros tão pesados de ausência de vida que chegavam a doer de verdade, sentiu que precisava parar, seu corpo pedia repouso. Então tentou adormecer embaixo de uma árvore, mas não conseguia. Era incessantemente atraída pela imagem que se projetava à sua frente. Um banquinho de madeira embutido em uma parede de reboco. Ela o olhava fixamente, de tal forma, que nem movia a pálpebra superior. Os olhos ressecados, faziam analogia à sua vida, aos seus sonhos. Lembrou-se então de um tal banquinho que havia diante de uma tal casa, ambos nunca avistados. Nem o banquinho, nem a casa. Foram voltas e voltas no mesmo quarteirão, sob o sol escaldante de meio-dia, sem sucesso imediato. O dia nunca foi seu aliado. A chuva caía lá fora, e ela fechou os olhos pra enxergar melhor a cena que se construía diante de si. Os olhos secos logo marejaram, e por mais que isso denotasse tristeza, mais lhe aliviava do que lhe afligia. Foi então que ouviu uma voz:

- A moça agora chora?

Assustada, ela se vira e reconhece o rapaz.

- Você de novo?

- Confesso que rodei quilômetros, mas não conseguia esquecer a moça indecifrável que entrou no meu carro e que, apesar de permanecer por apenas alguns minutos na minha presença, me fez ter vontade de retornar.

Adélia - esse era o nome dela, embora ele ainda não soubesse - olhava o moço com ar de espanto, enquanto ele prosseguia.

- Quem é você?

Como um animal acuado, ela nada respondia. Essa, sem sombra de dúvidas, era a pergunta que mais havia feito a si mesma nos últimos anos.

- Não lhe entendo, embora esteja fazendo um esforço enorme pra isso. Mas a leitura que faço de suas expressões e de seu olhar, é de que anda fugindo de alguma coisa, ao mesmo tempo que procura por outra. Estou certo?

Ela continuava mantendo o silêncio. Ele se tornava ensurdecedor a ambos, até que não pôde negar mais. A presença daquele desconhecido ali lhe fizera sentir algo que já havia esquecido que existia: uma segurança incomum; e durante algum tempo lutou contra essa certeza que lhe inundava e ao mesmo tempo lhe afagava. racionalizar sempre foi seu esporte preferido. Imediatamente, ao som doce daquela voz grave e rouca, Adélia sentiu as pálpebras pesarem, e inclinando-se em seu ombro fez menção de adormecer. Ele acolheu-a e, minutos depois, ainda um pouco sonolenta e sem abrir os olhos nem tirar a cabeça do corpo dele, balbuciou:

- Ah... antes que eu me esqueça... sim... eu ando fugindo da mesma coisa a qual busco incessantemente...
E após uma longa pausa, seguida de uma respiração profunda, concluiu reticentemente sem ousar se livrar do aconchego que lhe era oferecido:
- Fujo de mim mesma ao mesmo tempo que me caço, sem cessar...

terça-feira, março 09, 2010

Na estrada.


Chovia. O limpador de parabrisa trabalhando incessantemente respingava água em seu corpo parcialmente encharcado de suor e chuva. O rapaz, hipnotizado pela visão daquela mulher de corpo molhado e curvas sutis, apenas sorriu com encanto e disse:

- Entra aí, moça.

Ela entrou imediatamente, sem sequer pestanejar nem raciocinar em cima do fato de nem conhecê-lo. Estava meio que enfeitiçada pelo olhar penetrante do moço magro de musculatura torneada e sorriso tímido ao mesmo tempo que se sentia desnorteada. Talvez, inconscientemente, tenha interpretado seu convite como uma forma de saciar sua busca.

- Posso saber por que você, a essa hora da noite, anda por aí sozinha à caça de "adrenalina"? E sorriu disfarçadamente com o canto da boca sem tirar os olhos da estrada. Por um instante ela pareceu cair em si e respondeu-lhe com aspereza:

- Não me faça perguntas. Não converso com estranhos.

- Hummm... mas costuma entrar no carro deles?

Ambos se entreolharam e um silêncio tomou conta daquele espaço úmido que lentamente ia sendo preenchido pelo vapor das respirações dos dois.

- Pare o carro!

O rapaz parou e se posicionou próximo a um trilho de trem. Ela saiu do carro, mas antes que se afastasse o suficiente, ouviu ele dizer:

- Você não tem medo não, moça?

Mais uma pausa. Sim. A vida dela era feita todinha de pausas. Silêncios inoportunos. Dias muito curtos. Noites demasiadamente longas. Teve a vida toda pra sentir medo, cultivou-o durante longo tempo, mas agora havia desistido.

- Tenho sim... de não conseguir me fazer feliz...

- Pergunto se não tem medo da escuridão, da solidão, do frio, do vazio... de possíveis animais que possam vir a cruzar seu caminho... do trem...

Ela riu com desdém e uma lágrima rolando do canto do olho esquerdo.

- Como posso temer aquilo que me é tão íntimo?

Ele nada mais replicou. Ligou o carro e acelerou. Antes, porém, ainda disse:

- Não se iluda moça. Não vai encontrar o que procura em espécie. Vai correr o mundo inteiro, e talvez ache algo similar em algum hospital. Mas, ninguém vai te dar isso, a não ser que esteja à beira da morte; ou com o coração a ponto de parar.

- E quem lhe disse que já não ando assim?...

segunda-feira, março 08, 2010

Uma dose de adrenalina, por favor.

Saiu de casa sem rumo, meio pálida, andar lento, sem rumo. Parou no boteco da esquina, como nunca havia feito - ela nunca frequentara botecos - e, ao bater na mesa, gritou:

- Uma dose de adrenalina por favor!

E antes que o senhor de barba grande, palito entre os dentes e roupa manchada fizesse cara de desentendido ou lhe replicasse algo, continuou:

- Aliás, traz logo umas dez garrafas. Daquelas bem grandes, de dois litros, tá? E passa o telefone do fornecedor, por favor, quero fazer estoque. Quero uma adega disso!!! Não, não me olhe assim; não vou fazer comércio, nem contrabandear, nem nada, pelo amor de Deus... É só pra não faltar, entende? Sim, sim, eu sei que diabos de efeito colateral esse troço faz na gente, mas eu não tenho medo não. Quero mesmo sentir esse coração aqui pra saltar do peito, quero doçura correndo na veia pra vida ficar mais fácil de deglutir, quero overdose de oxigênio e disposição pra sair por aí correndo ou voando pelo mundo.

Ao final dessas palavras, todos olhavam pra ela com ar de espanto. Até que o dono do boteco respondeu-lhe em voz baixa e sem graça, quase um sussurro:

- Não tem disso aqui não, moça.

Por um momento ela permaneceu ali muda. Desapontada e cabisbaixa, logo se levantou e saiu do bar. Continuou no caminho. Sem rumo. Sem mala. Sem nada. Coração desacelerando. Respiração ralentando. Na boca, amargura sem fim. Vomitava uma sensação de quase inexistência. Na estrada, parou um carro e quando o motorista abaixou o vidro, ela praticamente implorou:

- Uma dose de adrenalina, por favor...

quinta-feira, março 04, 2010

Relatividade.

Sua certeza de infalibilidade me constrange, me assusta. O absolutismo manifestado em jamais incorrer em supostas faltas, ou pelo menos a pretensão disso, me remete à uma parte de mim que a uma altura dessas deve estar perdida em algum lugar do passado. Talvez você um dia se perca dela também. Ou não. Talvez viva apegado à ela por toda a vida, e seja feliz assim. Ou talvez perceba tarde demais que nessa vida alguns aprendizados dependem estritamente de erros. Que pra incorrer em erros ou acertos, a gente tem que tentar. Que é impossível acertar sempre. Que não dá pra prever nem controlar quase nada. Que a vida tem mais relatividade do que a gente imagina. E as palavras também.

quarta-feira, março 03, 2010

Melancolia.

Fazem-me bem essas gotas alternadas de melancolia que caem junto com o chuvisco regando essa noite nublada de março. Gatilho ideal de expulsão dos excessos daqui de dentro. Então, escrevo. A brisa é fria. As gotas são brilhantes, e chego a equipará-las com as estrelas que as densas nuvens teimam em esconder. A lua cheia, reclusa atrás da nebulosidade, faz falta; mas, sua majestosidade transparece ainda assim. Nana Caymmi canta Jobim no meu fone de ouvido, e a quase-perfeição da noite se completa. Estranhamente, o que falta pra torná-la completa, acho que ainda permanece dentro de mim. Mas é incapaz de eclodir por si só.