domingo, outubro 28, 2007

Nostalgia

O que mais me assusta no processo de viver não é a morte em si. O que mais me assusta é o correr enlouquecedor dos dias, o risco de ter uma existência vã, a incerteza do amanhã e, sobretudo, o fato de só termos apenas uma vida para se viver. E de não podermos voltar no tempo um só instante sequer, seja para fazer o que não foi feito, seja para refazer o que foi feito ou seja para jamais fazê-lo.


Com carinho, Mary.

sábado, outubro 27, 2007

Mais um dia de inverno...


Embora esteja sob forte emoção, condição diante da qual costumo escrever, as palavras teimam em não se organizar a fim de formar um texto. Fuçando o meu arquivo particular, acabei encontrando nas sábias e poéticas palavras do Pe. Fábio de Melo tudo que eu queria dizer hoje, e não consigo. Tudo que esse turbilhão de sentimentos e idéias está causando ao meu coração. Tudo o que meu coração atordoado não consegue sangrar.


"Hoje eu não sei dizer. Só sei sentir. Há dias em que as palavras não são capazes de traduzir o sentimento. E por isso a solidão se instaura. A sensação de estar só é a mesma de não saber dizer. Talvez seja por isso que só as pessoas que verdadeiramente se amam são capazes de suportar o silêncio... Ficar calado é uma forma de dizer sem conceituar. Os conceitos são formulações fáceis, o silêncio não. Descobrir o que o silêncio diz requer maestria, observação minuciosa. É bom não saber dizer... Bom mesmo é ser compreendido, mesmo quando não sabemos dizer... "


(Pe. Fábio de Melo)

sexta-feira, outubro 05, 2007

Sem disfarces


Eu sou assim. Talvez um dia eu mude. Talvez um dia eu aprenda a ser diferente. Mas, por enquanto eu sou assim. Um pouco transparente. Meu terapeuta costuma me chamar de "bandeirosa" (rs). Fingir não é algo que faço facilmente. Sobretudo se o fingimento em questão diz respeito a sentimentos. Custa-me muito. Meus sentimentos não surgem pela metade, e tão pouco permanecem da mesma forma. Não sei dar abraços medianos, beijos medíocres. Não consigo amar pela metade, elogiar pela metade, nem odiar pela metade. Ou amo ou odeio. Não consigo atingir o que beira o meado desses dois extremos. O que sobrar disso tudo, dentro de mim, é indiferença. Não sei sorrir pela metade, chorar pela metade, cantar pela metade... nem sei ser pela metade. Consegui deixar de ser extremista em vários outros aspectos da minha vida, mas nesse ainda não. Sou complexa e exata naquilo que considero essencial ser inteiro dentro em mim. Confesso que sou educada na medida do possível, diante daquilo (ou daqueles) que não me são simpáticos. E, como diria minha amiga Maria Marta, isso não é falsidade, é diplomacia, afinal, vivemos em uma sociedade, e conviver é muito mais do que uma arte. É necessidade.


Você não ouvirá de mim um elogio estonteante, se eu realmente não achei você linda com aquele vestido ou se o seu corte de cabelo não estiver belíssimo. Não vou colocar uma estrelinha no orkut se eu realmente não for sua fã. Eu não vou te entregar o convite do meu aniversário se realmente eu não faço questão da sua presença. E muito menos vou mandar flores no seu sem que dentro de mim não haja um sentimento que estimule essa atitude, porque pra mim, os atos, por mais belos e heróicos que possam vir a ser, começam na intenção do coração. Não falo nada pra agradar ninguém, em troca de possíveis favores. Isso pra mim se chama "puxa-saquismo", e eu não preciso disso.


Eu sou isso aqui que você vê. Sinto fome, sede, dor, raiva, medo, saudade, paixão... tropeço e xingo um palavrão [ou às vezes xingo sem tropeçar... rs]. Posso chorar quando sinto dor, quando vejo alguém sofrendo, ou quando assisto a filmes de romance. Sinto revolta, saudade, angústia, ansiedade, vontade de dar um murro em alguém, dou risada com meus amigos, frequento barzinhos sábado à noite, bebo whisky, martini e vinho, durmo até as 11 quando posso, faço terapia, assisto a novela das 8 (qdo tenho tempo) e ouço MPB. Gosto de forró e de Legião Urbana, de sapatos e sandálias, e de ficar sem fazer nada. Tenho cá os meus momentos de fraqueza e aridez, quando não enxergo horizonte algum à minha frente, e choro novamente para satisfazer as lágrimas que teimam em rolar da minha face. Sou isso aí. Feita de pó. Frágil, mais que tudo. Pequena e sempre precisando aprender algo.


Cansei de ser o projeto daquilo que a sociedade impõe, e, principalmente: cansei de me ocultar atrás das minhas incapacidades. Não vale a pena. Requer um gasto de energia absurdo. Pelo menos comigo funciona assim. Eu prefiro assumi-las e tentar vencê-las. Durante muito tempo da minha vida eu quis ser modelo e exemplo para todos, mas eu não soube dosar o meu perfeccionismo e agora, depois de perceber que nunca poderei ser perfeita, estou tendo que aprender a lidar com as frustrações que a vida me permite experimentar. E você acredita que eu me sinto mais viva, mais livre e mais humana depois de compreender essa verdade? Hoje não tenho mais interesse de mostrar para o mundo que eu sou "boazinha" e "perfeitinha"; até porque eu sei que eu não sou. Bom e perfeito, só Deus.


Hoje eu quero viver a inteireza da minha humanidade. Viver o meu processo de feitura, mesmo habitando esse corpo perecível, que me permite tantas limitações, fraquezas e defeitos, que são materias-primas para fabricação de virtudes. Mesmo habitando nesse mundo insano, que não admite erros e imperfeições, que promove a hipocrisia e a falsidade, o culto ao corpo e ao dinheiro, eu vou ser quem eu sou. Sem disfarces ou máscaras. Sendo sincera e fiel aos meus sentimentos. Quero ser eu mesma. Você pode até olhar pra mim e interpretar as coisas às sua maneira. Mas, eu não ligo. Aprendi com o Pe. Fábio de Melo a dar ouvidos apenas a quem me ama. E se você supõe ou profere uma inverdade ao meu respeito é porque não me ama. A gente só ama quem a gente conhece. E se me conhecesse, bem saberia porque eu sigo dessa forma. Eu sei de mim, e Deus sabe muito mais. O importante é que aos poucos eu estou me encontrando, sei o que eu estou buscando, e o quanto vale a pena.
  • Com carinho, Mary.

quarta-feira, outubro 03, 2007

Relações

"Quer atentar contra uma relação? Não perca a piada. Prefira perder o amigo. Demonstre apatia. Seja indiferente ao outro. Procure ao máximo não compreendê-lo. Analise os pormenores de fora... assim, é bem mais fácil tecer opiniões e soluções. Não se permita envolver-se. Não mande flores. Nem escreva bilhetinhos. Esqueça as palavras carinhosas, os elogios, e também esqueça o dia do aniversário. Ou melhor, até lembre, mas ao invés de ligar, enviar um email, ou ir lá pessoalmente, deixe pra lá. Priorize suas idéias e seus anseios. Deixe-o falando sozinho. Ria sadicamente do que ele diz, sobretudo daquilo que você considera improvável, impossível, ilusório, irracional. Ignore suas fraquezas e dificuldades. Deixe para amá-lo e compreendê-lo quando você achar que ele merece ser amado e compreendido. Quando achar que não deve nem ser amado nem compreendido, simplesmente bata a porta e saia. Use as palavras mais supérfluas em momentos igualmente inoportunos. É tiro e queda! Cultive as suas certezas e procure plantá-las no coração dele, já que apenas as suas são válidas. E o que fazer com as incertezas dele? Descarte-as. Afinal, são tão incertas que nem vale a pena dar ouvidos. Seja indolente aos seus anseios, confusões, angústias e dores. Ou, ao contrário, cale-se diante de sua estupidez, poupando-lhe o puxão-de-orelha necessário. Não leve nada, nada a sério mesmo. Nem a história de vida dele. Quando ele chorar, entregue-lhe um lenço de papel e complete o ato com a célebre frase: “pare de chorar, a vida é assim mesmo”, ou então: "se todos os problemas do mundo fossem fáceis de resolver como o seu..." Repita para ele que crise existencial é coisa de gente demente, e carência é o nome que inventaram para dar às pessoas irremediavelmente chatas e grudentas. Preocupe-se mais em resolver os problemas dele do que em ouvi-lo. Use uma capa para se esconder. Estabeleça metas: primeiro você, segundo você, terceiro você, e quarto, você também, claro! Não dê atenção para suas inquietações, sejam elas particulares ou se dizem respeito a ambos. Destrua os suas aspirações e fantasias, sutilmente. Use a intimidade conquistada para magoar, soltando o que vier à mente, afinal, vocês já se conhecem há tanto tempo! Confunda sinceridade com comentários desnecessários. Desista de confiar e deixe a sua confiança se perder. E jamais, em hipótese alguma, se coloque no lugar dele. Ironize suas escolhas e decisões, seus princípios e sonhos. Exclua-o de seus projetos. Segregue seus objetos e pertences. Priorize os defeitos mais do que as qualidades. Aproveite um momento de vulnerabilidade para proferir “a sua verdade”. Não peça perdão. Não aceite as suas diferenças. Sustente dentro de si a certeza de que você se basta. Alegue aquela carona para a praia do último verão. Desligue o seu senso do ridículo. Alimente muita expectativa acerca dele e depois diga que se decepcionou. Rejeite suas imperfeições, mas não queira enxergar que assim você o faz pelo simples fato de, lá no fundo, vocês serem muito semelhantes. Ironize sempre que houver oportunidade. Esteja sempre apressado. Exclua a palavra “consideração” do seu vocabulário particular. Mas, depois disso tudo, não se pergunte porque você não tem amigos. Nem ninguém."


Com carinho, Mary.
"Seria tão bom se pudéssemos nos relacionar sem que nenhum dos dois esperasse absolutamente nada, mas infelizmente nós, a gente, as pessoas, têm, temos - emoções."
(Caio Fernando Abreu)

terça-feira, outubro 02, 2007

O direito de ser fraco

Eu só comecei a crescer, quando assumi minhas fraquezas e limitações...


"Não é possível falar de crescimento humano se antes não falarmos de reconhecimento dos nossos limites. O bom treinador é aquele que vai saber salientar a qualidade do atleta, mas, sobretudo, vai saber encaminhá-lo para a superação dos limites. O primeiro passo é reconhecer onde a gente precisa melhorar.


É um grande desafio para todos nós porque, lamentavelmente, as pessoas não estão preparadas para nos educar para a coragem. Sabe por quê? Porque muitas vezes os incentivos que nos são dados estão mais voltados para esquecermos as nossas fragilidades. Quando mostramos as nossas fragilidades, há uma série de repreensões diante de nós.Você já reparou que a gente não deixa a criança chorar? Já reparou que quando o recém-nascido chora, nós fazemos de tudo para calar a boca dele. Fazemos uma série de "cara feia" para ver se a gente cala a criança, para tentar espantar a fragilidade. Nós, humanos, temos uma dificuldade imensa de lidar com a fragilidade do outro – ainda que seja filho da gente. Nós gostamos é de todo mundo feliz. Não estamos preparados para encarar a fragilidade. Parece que a nossa educação está sempre voltada para nos revestir de uma coragem que nos faz esquecer o limite.


Ter coragem é descobrir onde está a nossa fragilidade e ali trabalhar com um empenho um pouquinho maior. É não desconsiderar o que temos de bom, mas é também colocar atenção naquilo que ainda temos que melhorar. Estamos em processo de feitura. Não estou pronto, eu não sou perfeito, estou por ser feito, estou sendo feito aos poucos. E no processo de ser feito aos poucos eu vou descobrindo onde é que dói este espinho. Este espinho muda de lugar. Quanto mais uma pessoa está aperfeiçoada no processo de ser gente, maior é a facilidade de conhecer limites. Para você retirar um espinho, às vezes, é preciso deixar inflamar. É como se o seu corpo dissesse: “Isso não me pertence”. De qualquer jeito, nós temos que tirar aquilo que não nos pertence. Tem algumas inflamações do espírito, da personalidade que tem gente que é tão aborrecida que a gente não pode nem encostar. São aquelas inflamações que se alastram. E aí é que entra a grande contribuição do Cristianismo, numa proposta antropológica. Porque Deus não quer que você seja um anjinho na terra, mas que você deixe de ser inflamado. Ele quer te mostrar as inflamações para que você lute. Cara feia, arrogâncias, isso é complexo de inferioridade. Sabe qual é o espinho? O medo, a insegurança.Você já fez a experiência de viver uma palavra que te fez vazar em tudo o que estava estragado? Língua afiada quer dizer: deixar toda a inflamação que está dentro de nós vir para fora. Ter condições de vazar aquilo que antes a gente desconhecia é admitir e reconhecer que somos frágeis. A pior ignorância é aquela que finge que sabe! Temos medo de mostrar que não aprendemos, que somos frágeis. Quantas vezes na nossa vida, por medo, perdemos a oportunidade de aprender. Às vezes, por medo de expor a nossa fragilidade, porque parece que o mundo de hoje se esqueceu de mostrar a cultura do esforço que se fez para chegar aonde chegamos, perdemos o direito de chorar. E muitas vezes choramos e não sabemos o porquê estamos chorando.


O ensinamento de Jesus é sempre o avesso do avesso. Quer ser santo? Assuma que você é fraco. Muitas vezes, neste processo de se conhecer, a gente sangra. E nós precisamos sangrar. Um dos maiores poetas da música diz isso. Quantas vezes você não se viu traduzido em uma canção de alguém que teve a coragem de sangrar, não teve medo de mostrar as próprias fragilidades. Somos todos iguais. Nós, padres, somos todos iguais. Não adianta a gente fingir que é forte, ou ficar fingindo que não sente e que não tem medo. Eu não sei se você tem mais de cinco pessoas que conhecem os seus segredos. Para quantas pessoas você teve coragem de sangrar? Pessoas que te enxergam por dentro são raras. Conversão é isso. É você educar o seu filho para ele poder te contar onde estão os espinhos. O espinho não é o defeito, mas é a seta que nos mostra onde temos que trabalhar para ser melhor. A vida vai perdendo a graça porque não nos deixamos sangrar. A gente sangra melhor nos momentos de intimidade, onde a gente tem coragem de tirar a couraça. É muito melhor a gente admitir que tem medo. Para as pessoas ,é sempre doloroso ter que tirar os espinhos, de ver vazar as inflamações. Há tantas situações que nos deixam com o “coração na boca”. Às vezes, nós colocamos muito mais atenção naquilo que as pessoas estão achando de nós, do que no que nós pensamos de nós mesmos. Examine-se, você é uma pessoa que consegue levar o outro à cura. Em última instância, o que vai sobrar de nós é a nossa vontade de amar. Vamos descobrir o que hoje em nós está "infeccionado", porque é preciso sangrar, é preciso reconhecer-se frágil."


Pe. Fábio de Melo

segunda-feira, outubro 01, 2007


"Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida."


Clarice Lispector