quarta-feira, maio 22, 2013

Pra sonhar.


Tinha que dormir pra poder sonhar até ver, numa noite como outra qualquer, um sonho nunca antes sonhado se materializar. Não se tratava de estar sonhando acordada. Não era uma mera manifestação do inconsciente suscitado, de repente, num momento de consciência, nem muito menos uma fantasia travestida de realidade. Era você, simplesmente você, a clara configuração da raridade, sobrevivente de uma seleção natural ocorrida dentro do seu próprio gênero, espécie que eu julgava já estar extinta, mantenedor das gotas de tantas virtudes verdadeiramente imprescindíveis à essa humanidade decadente. É de você, de doçura quase que constrangedora, que o meu paladar se nega a enjoar. Você, esse ser de sorriso encantante,  de vocalização inebriante, de olhar cintilante e aroma de homem. Você, que me instiga rimas e versos, e um sentimento ainda incógnito que teima em saber se derramar homeopaticamente a cada minuto de contato, sorvendo em seguida a mistura do que sinto com aquilo que sentes e que também transborda de ti. Tinha que dormir pra poder tentar sonhar com você e ao acordar, então, perceber que você é mesmo um sonho, e só, e sei que, embora você tenha sido feito pra mim tanto quanto eu pra você, talvez nunca seremos  já que fomos ludibriados pelo tempo, que nos adiantou a nós dois e sumiu na esquina mais próxima e, provavelmente, não mais volta...

quarta-feira, março 06, 2013

Perdão. Perdi.





Rompi o pacto. Perdi a razão. Perdoe a mim. Perdoe o que se move dentro em mim. Perdoe o que me move a ti. Perdoe minha fraqueza e ao mesmo tempo agradeça à ela, pois da mesma veio a força para suportar tudo até aqui. Perdoe, por favor, mas agora, a força acabou. Acabou a paciência. Extinguiu-se o medo, a dor. Mas alguma parte de você ficou. Já aprendi a lidar com as erupções de saudade. Já não relevo mais nada, nem meço forças para obter o que quero. Já não ligo para quem venha a estar ao seu lado, já não pestanejo. Já não há o que perder, ao passo que ainda não nos perdemos um do outro. Mas, já não espero. Já não te quero, ainda que, por algumas horas minha vontade me desobedeça pra se unir à sua. Parece poético, e pode até ser, mas às vezes o amor involui,  antes de sublimar, meu bem. Aconteceu. Meu corpo ainda soletra baixinho cada parte do seu mas minha alma não se contenta mais com o alfabeto tão limitado que ele compreende. 

sexta-feira, março 01, 2013

Aqui dentro ou lá fora.


Mas há que se admitir que há o amor e há a paixão. Que eles são miscíveis, e que vez em quando gostam de andar cada um de um lado da rua. Mas, se na esquina mais breve eles não decidirem tomar a direção da mesma encruzilhada, simplesmente morrerão, já que um exerce sinergia sobre o outro. Ao final das contas existe uma imprescindibilidade mútua, e é ela quem vigora. Aqui dentro ou lá fora.

~ Mari Teixeira ~

segunda-feira, fevereiro 25, 2013

Eu tinha.


Eu tinha excluído as últimas fotos que restavam numa pasta oculta do meu computador. Eu as mantinha lá para impedir qualquer tipo de acesso rápido induzido por alguma saudade repentina; contemplar sua imagem consiste em evocar sua presença, e vez em quando eu precisava disso pra não surtar. Tinha apagado seu número do meu celular, não pra evitar impulsos próprios da carência ou da cachaça - o controle de mim você nunca conseguiu  arrancar-  mas, simplesmente por ter decidido deletá-lo da minha vida; era uma maneira simbólica de fazê-lo, ainda que, na mente, os números ainda eclodam de maneira quase constante. Eu dei as costas pra você e caminhei além, de cabeça erguida e repleta de certezas interiores, ainda que trouxesse no peito algumas poucas migalhas de esperança - voláteis migalhas de esperança. Eu tinha beijado outras bocas e provados de outros corpos, sonhado outros sonhos e traçado outros planos, mas tinha também a certeza de que, depois de você, jamais havia conseguido amar alguém da mesma maneira, quiçá além. Eu tinha você, e  às vezes eu nem acredito nisso, simplesmente porque os dias voam e carreiam consigo, sem o mínimo de piedade, aquilo que optou por não criar a mínima raiz. O tempo é mesmo mais cruel do que a dupla de fracos que usou de um outro fraco pra mexer com a minha fraqueza: você tem se tornado uma verdade tão distante, arrefecida, meio translúcida, quase que opaca, que eu, por vezes, me pego pensando se você não passou de uma mentira.  

Eu tinha entendido que você não era pra mim. Não que eu fosse melhor do que você, não é isso. Você só não merece o meu melhor, só isso. Merece a insanidade e o cativeiro, as correntes e os cadeados, bem como o chiado ensurdecedor da chantagem emocional perpétua e as máscaras que a acompanham de brinde, já que compactua com a crueldade a partir do momento que optou por omitir a única coisa que liberta e faz feliz: a verdade. Você não merece o que cabe no meu infinito e que, por tanto tempo eu insisti em transferir pra você. Aliás, o infinito não lhe cabe: a mesquinhez a qual você compartilha diariamente por meio de beijos, sexo e telefonemas só tende a te reduzir. Você é incapaz de gerir sua própria escolha, insistindo em outras paralelas. Você não sabe o que quer e muito menos quem é, ao contrário de mim que sei o suficiente o que quero e quem sou, pra me resumir aos seus resumos e rascunhos. Eu pensava que você era meu número, que você fazia o meu tipo, mas eu estava enganada. Eu sou do tipo que constrói arranha-céus de concreto e aquarela enquanto você prefere sujar as mãos com castelos de areia e água oxigenada barata. 

~ Mari Teixeira ~

quinta-feira, janeiro 10, 2013

Eu só queria te ver.


Se esse hoje amanhecesse bem no dia do seu aniversário, eu só ia querer te ver, já que não é mais possível amanhecer ao lado seu. De longe ou perto, errado ou certo, falante ou mudo, eu queria te ver. Mas se eu não pudesse fitar-te, ligaria, ainda que isso fosse desnecessário, inconsequente, idiota ou incoerente. Ainda que fosse impossível ouvir sua voz; eu só queria que você ouvisse a minha. Ainda que você não merecesse sequer minha lembrança, ou minha torcida, minhas melhores intenções e muito menos o meu sentir, só queria isso: te ver. Ainda que você se achasse, eu não me importaria em me perder, sobretudo se o labirinto em questão fosse você. Ainda que tudo tenha sido um sonho, e que eu não tenha sido pra você um terço sequer do que você foi pra mim, ainda que eu não aprenda nunca a dosear minha doação como eu aprendo na faculdade a dosear medicamentos, eu só queria te dizer que eu só queria te ver.

~  Mari Teixeira ~ 


segunda-feira, janeiro 07, 2013

Nove meses.


"Nove meses sem você.

Tempo de dar à luz à tua ausência 
gestada em mim, enfim..."

(Well Pires)

Nove meses sem você. E quando eu digo "sem", soletro cada letra com a alma e sinto minhas entranhas ressonarem com o peso literal que tal palavra traz. A impressão que tenho é de ausência total e perene mesmo, ainda que tenhamos nos trombado pelas esquinas da nossa existência nesse espaço de tempo. Nove meses de ausência. Uma ausência que carrega entranhada em si a intensidade de um nada proporcional ao amor que eu um dia senti por você. Tenho que te dizer: acho que você desaprendeu tanta coisa durante esse tempo! Desaprendeu a ser você, e arrisco dizer que anda mestre nesta arte da despersonificação - chego a acreditar que se tornou algo prazeroso e que esse coração que bate no seu peito não serve para nada além de bombear sangue. Você desaprendeu,  inclusive, a ficar. Ou teria sido eu que aprendi a deixar você ir? Não sei. Só sei que já faz nove meses que eu concebi tua ausência, e a gestei em meio a dores, lembranças, saudade e amor. Vi minha alma dilatar aos poucos, enquanto tudo isso crescia dentro de mim, nutridos por um não-sei-o-quê de esperança que se incorporou também à tudo que já foi citado. Agora é a hora. Do parto. Do partir. De te deixar partir. De me partir também. De repartir teus retalhos que impregnaram em mim, lançar fora teus resquícios. Não há mais o que esperar, não há mais o que gerar. É fim de jogo, meu amor. Início de vida. Minha vida. Nova vida.