domingo, maio 06, 2018

Pra que saber?




Bom dia, Heitor!

Veja como são as coisas... soube que você encontrou o Tony pela rua e perguntou como eu estava. A mesma pergunta lançou à Clarissa, poucos dias depois. Ambos vieram me contar de sua suposta preocupação com minha integridade mental e emocional. A fala deles, não sei se denotava conforto ou fofoca, não sei mesmo, mas ainda assim ouvi com o estremecimento interior característico de quem recebe notícias daquele que foi o grande amor de sua vida. Antes de mais nada quero que saiba que proibi todo e qualquer ser vivente falante de me contar sobre você, sua vida, sua amante, seus trabalhos e afins. Além de não ser mais da minha conta, não existe algo mais torturante do que saber acerca de quem que não se pode mais ter. 

Por um milésimo de segundo imaginei que sua pergunta veio recheada de culpa, remorso, curiosidade ou conveniência, e fiquei com a quase absoluta certeza da última opção, posto que te conheço relativamente bem. Abraçar essa opção também não deixa de ser conveniente pra mim. É mesmo muito baixa a forma pela qual você consegue passear pela existência alheia, plantar promessas e retirar-se como se nada houvesse acontecido, como se nada houvesse significado, jogando tudo em meio ao vácuo.

Você me disse que nunca sofreu por amor e, na hora, eu fiquei me perguntando como alguém na sua idade poderia ter passado ileso pelas ciladas desse mocinho-bandido. Mas, pudera, Heitor. Você nunca amou. Pensa que ama. Você confunde bundas, bucetas e peitos com amor, e abre a boca com toda a irresponsabilidade da vida pra dizer que ama. Ama o caralho, Heitor! Você patina pelas pessoas, vive dos momentos que consegue proporcionar a elas e, consequentemente, a si. Você não sabe o que é ter água pelo pescoço, arriscar dar mais um passo, não dar pé, se afogar, morrer e ressuscitar. Você brinca no raso, às vezes desequilibra e toma um leve caldo, engole um pouco de água, tosse, levanta, nem troca o lençol e já joga outra em sua cama. Você é tão superficial quanto risca a pele das pessoas. O problema é quando você pega gente sem pele como eu. Nascida queimada em terceiro grau. Sensível e intensa de doer. Aí você risca a alma. E dor de alma só sente quem tem uma o que, definitivamente, não é o seu caso.

É bem verdade que vivi muitos bons momentos com você. Excelentes. Perfeitos. Não sobrepujam a dor que você me causou, mesmo essas duas coisas estando separadas pela mais tênue linha que possa existir nessa vida. Ou talvez porque, pra mim, sejam coisas miscíveis. O fato é que você não tatuou só meu corpo, mas também minha alma. E ao final, você também não fodeu só meu corpo; fodeu minha alma, e agora tá fodendo outra por aí. Você segue um padrão podre, Heitor. Fétido. Desprezível.

Portanto, pra que saber de mim? Pra que eu saber de você? Morremos um para o outro no dia em que você desfez nosso laço, e mortos desaparecem. Decompõem-se. Pra uns viram anjos, pra outros demônios, e pra outros nada. Não acredito em anjos e demônios, Heitor, sabes bem disso. Restou-te o nada.

Com nada,

Helena

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